Breve histórico...

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"O diabo desta vida é que entre cem caminhos temos que escolher apenas um, e viver com a nostalgia dos outros noventa e nove." Fernando Sabino

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Adélia me salvou.

Sim, a poetisa divinopolitana me salvou.
Salvou minha alma da morte certa, da pandemia da frustração. Me salvou. E eu preciso dizer que Adélia tocou meu coração e falou coisas que eu precisava ouvir. Adélia falou coisas que eu sabia, mas que ultimamente andava negando para mim mesma. Adélia me trouxe de volta ao meu mundo, foi meu antídoto e minha cura permanente!

Eu me emocionei. E as lágrimas desceram de forma lenta, sem a agitação costumeira das lágrimas. Elas expressavam, de forma natural, a emoção da minha alma, que andava quase morta, que estava quase desistindo de todas as coisas belas, boas e gostosas da vida. Adélia foi o presente divino para um corpo moribundo. Moribunda estava, Adélia me curou.

Tocou fundo com suas primeiras palavras: todos buscamos as mesmas respostas. O cientista, o religioso, o artista. Todos buscam a beleza. Todos buscam compreender a vida. E de todos, o artista é aquele que melhor toca a alma, pois consegue fazer com que haja observação. Dos distraídos aos apressados, todos são tocados pela arte. E mesmo aqueles que não são tocados diretamente pela arte, são tocados pelas mesmas perguntas. De onde viemos e para onde vamos. Ciência e Religião e Arte. Todos buscando o sentindo da vida.

A beleza é o sentido da vida. A beleza nos pequenos gestos, nas delicadezas, na observância da natureza e do outro. A compaixão, o amor, a felicidade.O poeta é um abençoado! Se Deus criou os poetas, deixou neles sua melhor parte. A parte da sensibilidade de enxergar na pedra algo que vai além da pedra cascalho no meio do caminho atrapalhando o moço que vem distraído.

A poesia é um sopro de vida. Sem vida não há poesia e sem poesia a vida fica demasiadamente pesada, chata, mesquinha, dura, complexa. Sempre quis ser poeta. Mas a inspiração divina é para poucos. Poucos conseguem traduzir em palavras a beleza, a suntuosidade e a melancolia da vida. Eu me arrisco a colocar no papel, vez ou outra, algumas palavras, alguns vestígios do que eu vejo e sinto. Porque o poema é atemporal e anônimo. O poeta tem que ser capaz de transformar sua alegria e sua dor em sentimento universal. Tem que traduzir para o outro aquele embargo na garganta, aquele alvoroço no estômago.

Adélia me salvou da pandemia do cotidiano das cobranças exageradas. Adélia me trouxe o sorriso de volta, a alegria em olhar para além do que está ali, marcado em uma realidade cinza escuro. Adélia me fez recordar o quanto sou feliz vivendo com minha sensibilidade exacerbada. Só tenho que agradecer a poetisa divinopolitana que fez respiração boca-a-boca em minha alma e me trouxe de volta para a minha realidade.

Me emociono ao lembrar das palavras dela. De sua sinceridade, de sua alma tão linda! Me apaixonei por Adélia! Ela me trouxe de volta! Vocês entendem que ela me trouxe de volta?! Estava tão perdida nesse mundo cinza. Os outros sempre me repreendem por ser sensível demais, brincalhona demais e por cometer todos os dias demasiados pecados capitais. Mas Adélia disse que tudo bem ser assim. Tudo bem ser feliz, tudo bem se emocionar e tudo bem pular na poça d'água e cair na gargalhada.

Andava muito séria, muito, muito, muitooo taciturna. Já ia desistindo daquilo que realmente move minha alma. Mas Adélia apareceu! Adélia anjo, arcanjo, virtude e me deu a mão e secou minhas lágrimas e me alegrou a alma.

Após meu encontro com Adélia, até meu sorriso mudou, minha pele ficou mais bonita e consigo novamente ver poesia onde só via pedra.

Só tenho que agradecer á Adélia Prado.
Nesse deserto de almas, é difícil encontrar o que vale a pena. Encontrei Adélia. Não quero perdê-la.
Não quero perder a beleza da vida, a essência, o amor.
Se Deus existe - e eu sei que ele existe- ele é poeta, é pintor, é artista.
Disso eu desconfiava, agora tenho certeza. Adélia me mostrou que sim. Adélia me mostrou a verdadeira poesia.

Obrigada.




segunda-feira, 27 de agosto de 2012

"Te trarei das montanhas flores alegres" se alegre tu me fizer.


Da mesma maneira que não há sentimento para bonitas cartas de amor,
não há sensibilidade para compreender a essência de um Neruda.
Há de saber com quem tu gastas as palavras de Neruda.
Há aqueles que merecem, e por si só, fazem os versos ganharem forma.
Outros tantos, sequer sabem do que o poeta fala,
porque o poeta fala de sentimentos bonitos
que podem ser transcritos em uma verdadeira carta de amor.
Há aqueles muitos, que até conhecem os sentimentos versados,
mas não merecem recebê-los por minhas mãos.
Da mesma forma que não se deve gastar
os “eu te amo” da vida com pessoas superficiais,
Não devemos distribuir Nerudas ao gosto e ao léu.
Da mesma forma que não há amor,
não se podem haver bonitos Nerudas a enfeitar caixinhas
de correios, tanto reais quanto virtuais.
Deveria saber disso, eu.
Mas ainda insisto em erros.
Nesse nunca mais. Neruda só para aquele que realmente merecer,
Neruda agora só para aquele que me merecer,
merecer as cerejas e os ipês em flor.
Nada de andar por aí florescendo para quem não sabe sentir,
para quem não sabe demonstrar o sentir.
Nem todas as cartas de amor são ridículas
E nem todos os homens merecem um Neruda.


"Quando não te doeu acostumar-te a mim,

 à minha alma solitária e selvagem, 

 a meu nome que todo afugentam. 

 Tantas vezes vimos arder o luzeiro 

 nos beijando os olhos e sobre nossas cabeças 
 destorcer-se os crepúsculos em girantes abanos. 
 Sobre ti minhas palavras choveram carícias. 
 Desde faz tempo amei teu corpo de nácar ensolarado. 
 Chego a te crer a dona do universo.
 Te trarei das montanhas flores alegres,
 copihues, avelãs escuras, e cestas silvestres de beijos. 
 Quero fazer contigo o que a primavera faz com as cerejas."

Pablo Neruda.



Cabe dizer que poucas mulheres merecem um Neruda.
Um dia eu mereci. Espero merecê-lo novamente,
pois florescer assim e fazer florescer é uma dádiva para poucos.




sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Qual é a carta de amor mais bonita que você já recebeu?


Já recebi cartas de amor, cartões, mensagens, bilhetinhos, todos cheios de sentimento verdadeiro. Sim, de um sentimento que brotava no mais fundo da alma e transbordava aos montes para todos os lados. Em cada cantinho do papel existia um pingo de amor, de carinho, de admiração.
Guardo essas cartas, cartões, mensagens, bilhetinhos. Guardo com muito carinho, porque foram sinceras aquelas palavras. Talvez as palavras mais bonitas que eu já recebi em toda a minha vida. E tem dias assim que você se pergunta se aquelas palavras não estão te fazendo falta. E você corre lá, e lê uma por uma, as cartas de amor mais bonitas que você podia ter recebido de alguém.
E ta tudo ali, no preto e branco do papel e da tinta, nos detalhes de cada palavra, no simbolismo de cada papelzinho rasgado, recortado e colado. E você lê coisas e se lembra de como você era. De como você era admirada e amada. Não são apenas palavras soltas no papel, são sentimentos únicos guardados ali, sentimentos que podem até não mais existir, mas está ali como um documento, como uma prova de sua existência.
Cada pessoa é de uma forma e cada sentimento se manifesta de uma maneira. Hoje não há mais cartas de amor, porque o amor não existe como existia...
Hoje, quando vou pegar minha caixinha de lembranças, não encontro lembranças bonitas. Há palavras tão duras e uma sinceridade enorme me mostrando que todo o esforço foi meu, que todas as palavras de carinho e admiração partiram de mim, sem retorno.
Não há amor nessas lembranças. Há desdém, medo, comodismo. E eu sofro. Sofro porque eu tenho a consciência do amor que eu sinto. Sofro porque eu realmente sinto um amor muito mais bonito do que aquele que reli nas belas cartas. Mas sou eu que sinto isso. Não há retribuição desse sentimento, como existia naquelas cartas.
Não sei dizer qual o problema, mas reler essas cartas tão lindas me fez enxergar que eu não tenho nem a metade do que eu tinha, e ando sorridente por ai. Mas reler essas cartas tão lindas, me fez perceber que talvez eu tenha me acostumado a tão pouco.
Não me certifiquei do amor alheio quando me lancei em nova empreitada. Na verdade, fui avisada diversas vezes, mas fui teimosa. Agora só me restam lembranças bonitas dentro de uma caixa lilás surrada. Só me restam àquelas lindas cartas de amor, que hoje me fizeram chorar, simplesmente porque me lembraram de como é bom ser amado em retribuição.
E se me perguntarem qual a carta de amor mais bonita que eu já recebi, não saberei responder, porque ainda espero por ela. Ainda espero. Não sei por quanto tempo, mas ainda espero essa carta chegar...

Renoir, 1891.


quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Te vejo dentro

Te vejo dentro,
aceito esse peso,
essa delícia de te ter assim,
colado, suado, desnudo.

Me vejo dentro também,
dividindo esse peso,
essa ânsia de vida, de vitória,
e me calo e me iludo com a imaginação.

Dois seres unidos pela carne,
enlaçados pela alma.
Parece que, finalmente,
as almas se acertaram. Acertaram os passos.

Se te vejo,
te sinto inteiro nos teus beijos,
e teus olhos,
encantadores olhos oblíquos,

me tomam a alma,
fazem arrepiar todos os cabelos do corpo
e me lançam ao mais puro gozo.
Onde eu me entrego novamente...

Não te quero apenas porque te quero,
te quero porque além do corpo,
quero tua alma,
sugar tua alma como te sugo o gosto.

Quero as entranhas encantadas de palavras,
quero o cheiro perpetuado em velhas páginas,
quero o olhar de criança para o mundo,
para um mundo onde nossas almas se conhecem

e podem se amar.
Se nossas almas se entrelaçam tão bem...
Eu, eu que te vejo dentro,
não consigo mais conter palavras!

Grito alto, falo baixo, imagino e sonho,
com os dias inteiros ao teu lado,
dividindo proezas, brigando feito irmãos,
e se amando como dois selvagens.

Não há mais nada para ser dito,
eu já disse,
Mas são teus olhos oblíquos e teu cheiro,
aquele cheiro de macho,

Que me dominam,
que me dominam por inteira.
Te vejo dentro, me vejo dentro,
não há mais como fugir.

E eu sei que não há mais como fugir,
porque se eu te deixar,
algo em mim morrerá lentamente,
e eu nem imagino o que será de mim.

Se você me deixar,
perderei o rumo,
e o cinza dominará meu mundo,
e é por isso que sei que te amo.

Mas se você me deixar,
saiba bem que irei chorar,
sofrer, despedaçar,
mas seguirei o caminho,

Sem olhos oblíquos
e sem cheiro de macho.
Segurei o caminho sem corpos suados
e almas entrelaçadas.

Mas te vejo dentro,
e mesmo não sabendo de ti,
Você me devora, eu te devoro,
e vamos ambos, devorando a vida.

Compartilharia uma vida inteira com você,
com chatice e rabugice, 
com encantamentos e alegrias.
compartilharia inteirinha derrotas e vitórias...

Compartilho, vivencio, esqueço.
Te vejo dentro,
Eu vejo os teus olhos nos meus olhos,
e nada mais importa,

Nem o que fomos,
nem o que seremos,
O que somos unidos,
é o que me importa agora...

Bruno Steinbach. ”Transmigração”. Bruno Steinbach. Óleo/duratex, 122,5x91 cm, 1998, Mossoró, Rio Grande do Norte, Brasil. Coleção Particular. Catálogo 96.Parte inferior do formulário


quarta-feira, 25 de julho de 2012

Das incertezas do cotidiano...


Quando a gente ta meio esquisito, amuado, sozinho, a gente acaba se perdendo em velhos caminhos conhecidos, tropeçando em velhos vestígios e relembrando coisas que, de tão antigas, já estão envoltas em brumas negras. A memória é algo fantástico! É ativada de forma insuspeita, de forma involuntária por uma música, por um cheiro, por um gosto... Refazer velhos caminhos cotidianos trás de vez em quando, esse sentimento, essas lembranças. Caio Fernando Abreu dizia algo semelhante, dizia que a dor não existia, apenas a cicatriz, que latejava loucamente em dias de chuva. Os velhos caminhos não se desmancham, eles continuam sólidos como as mais queridas lembranças. Há aqueles que se negam a esquecê-las e as idolatram como o melhor período da vida. Já outros, buscam esquecê-las porque elas não lhe fazem bem. Eu, ao contrário, deixo-as guardadinhas, minha memória nunca foi uma coisa assim, astuta, memória mesmo. Minha memória é catatônica, é oca, é eternamente aprendiz das incertezas do caminho. Outro dia, uma amiga minha me disse que quanto mais velho ficamos, mais duros nos tornamos. De certa maneira sim, mas eu não consigo endurecer esse velho músculo pulsante, eu não consigo esquecer as boas coisas que cada caminho me leva a conhecer, as cicatrizes não latejam loucamente em dias de chuva, elas são apenas uma lembrança envolta em brumas negras, cor de rosa, azuis, brancas... Sou um paradoxo ambulante, eu sei. Cada caminho descaminhado me leva a algo novo, surpreendentemente novo. Tenho problemas de memória, talvez desvio de atenção, porque não guardo muito bem as coisas... talvez eu só guarde mesmo aquelas palavrinhas (mal)ditas... Mas isso tem a ver com meu signo... Capricórnio não é um ser mitológico que esquece os maus - tratos... Ele remói. Eu remoeria se tivesse a memória mais forte... Porém, há algo em mim que destoa de signos, de tempo e de memória... mesmo eu querendo remoer algo ruim, pra fazer a cicatriz latejar doidamente em dias de sol, de chuva, de brumas, logo a lembrança é substituída por coisas boas, legais, imaginação... Acho que minha imaginação é mais forte que a memória, por isso eu vivo nas incertezas do cotidiano, mesmo tendo aprendido mil vezes a mesma lição. Se me deparo novamente com algo semelhante, caio na mesma armadilha, caio no mesmo encantamento, caio na mesma alegria. Afinal, a vida é feita de incertezas, de memórias e de caminhos. Caminhos que refazemos sempre, seja sozinho, acompanhado, triste ou feliz, se tornam novos caminhos. Vá sozinho, vá acompanhado, mas vá. Caminhos incertos do cotidiano acabam se tornando os caminhos certos da antimonotonia. Fica a dica.

"Caminho conduzindopara High Grass" c 1875, Musée d'Orsay, Paris.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Medos esquisitos


Estou um pouco triste,
Triste porque tenho olhado muito para trás
Pensando nas coisas que poderiam ter sido
E não foram.
Olhando para trás e percebendo o tempo
Que perdemos com medos esquisitos...
E hoje sei que o tempo que perdemos
Com medos esquisitos
Vai pesar escolhas no futuro próximo.
E eu nunca chorei tanto como chorei
Nesse tempo perdido com medos esquisitos...
E choro ainda hoje,
Por não saber se existe algo de forte e verdadeiro
Entre eu e ele,
Entre eu e o moço bonito que tem poder sobre mim.
E tudo isso porque perdemos muito tempo
Com medos esquisitos.
E agora essa tristeza só tem hora pra começar,
Porque pra acabar mesmo
Só Deus sabe quando...
E agora fico melancólica,
semeando lembranças em um jardim
aguado de lágrimas.
Há em mim algo que não sei dizer
se é tristeza ou medo ou insegurança.
Mas não há nada que eu possa fazer,
Tudo o que eu podia fazer, eu fiz.
Resta agora o tempo e o destino,
O tempo malvado e o destino traiçoeiro...
Se existe algum sentimento,
talvez ele sobreviva,
Mas se for como eu realmente penso,
que só existe por pressão psicológica,
solidão e comodismo,
Vai desmanchar no ar.
Só o tempo e o destino para saber se existe algo de forte e verdadeiro
entre eu e ele,
entre eu e o moço bonito que tem poder sobre mim...


Há medos esquisitos dentro da gente. Medo esquisito porque não sabemos lidar direito com ele, porque enxergamos nos outros uma possibilidade de erro. Esse medo esquisito atrasa a vida da gente, não deixa as pessoas vivenciarem uma nova experiência ou um novo amor simplesmente por medo esquisito da vida se repetir. Ora, a vida é muito curta e muito rápida para se ficar preso em medos de experiência. O horizonte de expectativa é imenso e a gente acaba projetando no futuro os fracassos do passado, esquecendo que o presente é o meandro da construção dessa expectativa. A minha expectativa foi forjada em uma experiência banhada em medos esquisitos, e agora? O passado virou experiência esquisita, o horizonte de expectativa é tenso, e o presente acaba se perdendo nesse ínterim de coisas estranhas. Coisas estranhas? Sim, meus caros, porque eu sou estranha e acabo projetando coisas lááá na frente. Ansiedade, alguns diriam. Eu digo que sim, ansiedade e ânsia de vivenciar tudo o que eu sonho. Mas a experiência não foi completamente perfeita. O amor não foi a primeira vista, não foi com o primeiro beijo que ele e eu nos apaixonamos, como sempre acontecia com ele e comigo foi, e houve desencontros tão longos e doloridos... Como foram doloridos... Mas agora que não há mais motivos para medos esquisitos, tenho em mim essa tristeza estranha. Tristeza forjada na experiência do presente passado e do presente atuante. Confusão de termos, de tempos, de sentimentos. Creio que são poucos aqueles que não são confusos assim, quando a questão é amor ou qualquer outro sentimento. 
Deixe as coisas acontecerem lentamente... Como um veneno entrando nas veias até chegar ao ápice, estourando o coração...

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Meu Cérbero

Já sei,
não posso mais fazer nada...
O meu coração é aquele que rege meus passos tão espaçados
e nesse jardim eu já me cansei de perder.
Mas não posso mais fazer nada...
Porque são aqueles oblíquos olhos que me guiam,
e aquele rosto em preto e branco 
é como uma placa que indica a direção para o paraíso.

Ah... quantas voltas ainda tenho que dar,
quantos dragões poderão me ajudar
a chegar ao meu real lugar?
Já não são tempos de fantasia,
o real é como o grande apocalipse de João,
e eu não consigo deixar para trás pequenas coisas...
E corro o risco de ser lançada as chamas pecaminosas
dos homens reais.

Não posso fazer mais nada,
meu coração está completamente envolvido
pelo moço tímido de olhos oblíquos,
aquele mesmo moço que tem poder sobre minha alma,
e que consegue atormentar meus pensamentos...
Ah, que tormento delicioso... 
Os sonhos são tão reais e eu acordo sempre extasiada...
Mas os sonhos correm o risco da morte dos deuses...

O tempo da fantasia acabou,
agora o real ameaça,
nem os dragões mais existem!
Todos viraram fumaça! E eu?
Eu insisto em ver tudo com os mesmos olhos,
olhos de criança com uma pitada de malícia adulta.
Não há mais o que fazer,
o apocalipse já tomou minha visão...

Idílica visão do amor,
paradoxal versão da paixão,
entre corpos entrelaçados e almas perdidas,
não consigo parar para raciocinar meu caminho.
Aqueles olhos oblíquos me dominam
e eu não consigo desvencilhar de seu poder.
E nem desejo, por enquanto.

Enquanto isso vou vivendo em um caminho perdido
no jardim da minha casa,
onde a face em preto e branco me tem inteira,
e como um passe de mágica,
domina meus sentidos.
Não consigo esquecer certas mágoas
e sofro.
Não consigo dominar meus desejos
e isso causa dores.

Sou como Cérbero,
um cão demoníaco, maldoso, poderoso,
que demonstra amabilidade a qualquer ser
que consiga dominá-lo com amor.
Sou como Cérbero que espera
pelo verdadeiro domador de demônios,
que espera pelo dom do domador de almas.
Espero que ele não desista de se aproximar de mim...

Essa carapuça que visto é pesada demais,
e preciso ter confiança para arrancá-la.
E já não há mais nada que eu possa fazer,
apenas torcer para que o domador não desista de mim,
como eu não desisti.
Mas ninguém é igual a ninguém e eu sei
que o Cérbero em mim não é um animal fácil...
Nem mil dragões me dominam,
apenas aqueles olhos oblíquos conseguem
trazer um pouco de paz....

Psiqué alimentando Cérbero com pão.




quarta-feira, 13 de junho de 2012

Outra carta

Albrecht Dürer- Melancolia


Eu não tinha esses olhos de hoje, olhos tão úmidos e tão tristes. Na verdade eu não tinha sentimentos tão terríveis dentro de mim como agora. Meu sorriso era verdadeiro, minhas palavras não eram medidas e eu não precisava ficar me segurando. Segurando sentimentos, ações, palavras. Esse rosto marcado não é o meu rosto e esse sorriso... Esse sorriso falso de meia-boca não é o meu sorriso e nem essas palavras poderiam ser minhas. Sou tão triste que não me reconheço no espelho. A minha docilidade está decadente, estou muito chata, reclamando muito, nem mesmo consigo me encarar no espelho sem que uma simples lágrima caia de meus olhinhos tão desiludidos. Acho que a palavra é essa mesma: desilusão. Não que eu tenha criado muita expectativa, não que eu espere demais das pessoas, mas sim eu espero apenas o mínimo dos outros. O mínimo de atenção, o mínimo de civilidade, o mínimo de compaixão, o mínimo de carinho. Talvez eu espere a retribuição por alguma coisa, ou talvez eu já esteja tão perdida que nem isso eu deseje mais. Parece que estou em uma queda de braços comigo mesma, pra ver até onde eu posso ir desse jeito, nessa luta. Mas essa luta vem me transformando no pior que eu poderia ser. Ao invés de me fazer transbordar em rios de felicidade, estou me afogando cada dia mais em rios de angústia, de insatisfação. Eu não tinha esses olhos tão marcados, essa face tão molhada, essa dor que me pega todos os dias quando vou me deitar pensando em como eu era feliz e não sabia. E como agora eu estou tão longe de alcançar algo que eu sempre tive do meu lado. Sempre tive, desde sempre, hoje não tenho mais. Hoje já não consigo ver qualquer possibilidade de futuro bom. Antes eu enxergava, antes eu sabia que existia possibilidades, hoje já não há e não é por minha culpa. Porque eu fiz tudo o que podia, fiz tudo o que estava ao meu alcance e tenho a consciência tranqüila quanto a isso. Mas o mundo não é bom para todos... Se nem as pessoas são iguais, porque os sentimentos deveriam ser, não é verdade? Mas o que me causa maior dor nesses dias de chumbo, é saber que tem gente que existe para tampar buracos, para consertar pequenos machucados. E existem tantas dessas pessoas no mundo, que trancam a própria dor para cuidar da dor do outro... E existem pessoas que sabem bem que são apenas substitutas, que estão ali apenas para curar e ensinar o outro. O problema é que não há ninguém para cuidar delas. E elas sofrem, elas vão decaindo, vão se transformando naquilo que mais odeiam. Até que finalmente acordam e tomam a difícil decisão de renunciar ao exercício de altruísmo e se vão. E ao invés de esperarem por uma pessoa substituta, curam a si próprias com aqueles restos de sentimentos bons que ainda permanecem. Como se esses sentimentos fossem luzinhas pequeninas em uma noite escura, e que lentamente ao se juntarem se transformam em um grande feixe de luz e trás de volta tudo o que estava escondido, eliminando de vez aquilo terrível que tinham se transformado. Sinto que está chegando à hora de partir, de deixar para trás novamente uma alma renovada, mas não minha alma. Vocês podem dizer que vou perder, mas o velho ditado não mente quando diz que não se perde o que nunca se teve. Fácil assim. Eu prefiro perder o que nunca tive a perder aquilo que move minha alma, meus sonhos, minha vida. O mundo anda cada dia mais complicado e não dá mais pra fazer tudo por uma só pessoa... Até dá, mas isso já é outra história...


"Lá está ela, mais uma vez. Não sei, não vou saber, não dá pra entender como ela não se cansa disso. Sabe que tudo acontece como um jogo, se é de azar ou de sorte, não dá pra prever. Ou melhor, até se pode prever, mas ela dispensa.
Acredito que essa moça, no fundo gosta dessas coisas. De se apaixonar, de se jogar num rio onde ela não sabe se consegue nadar. Ela não desiste e leva bóias. E se ela se afogar, se recupera.
Estranho e que ela já apanhou demais da vida. Essa moça tem relacionamentos estranhos, acho que ela está condicionada a ser uma pessoa substituta. E quem não é?
A gente sempre acha que é especial na vida de alguém, mas o que te garante que você não está somente servindo pra tapar buracos, servindo de curativo pras feridas antigas?
A moça…ela muito amou, ama, amará, e muito se machuca também. Porque amar também é isso, não? Dar o seu melhor pra curar outra pessoa de todos os golpes, até que ela fique bem e te deixe pra trás, fraco e sangrando. Daí você espera por alguém que venha te curar.
Às vezes esse alguém aparece, outras vezes, não. E pra ela? Por quem ela espera?
E assim, aos poucos, ela se esquece dos socos, pontapés, golpes baixos que a vida lhe deu, lhe dará. 
A moça – que não era Capitu, mas também têm olhos de ressaca – levanta e segue em frente. 
Não por ser forte, e sim pelo contrário… Por saber que é fraca o bastante para não conseguir ter ódio no seu coração, na sua alma, na sua essência. E ama, sabendo que vai chorar muitas vezes ainda. Afinal, foi chorando que ela, você e todos os outros, vieram ao mundo."

Caio Fernando Abreu - Morangos Mofados




quinta-feira, 31 de maio de 2012

Estação


- Senta aqui do meu lado e espera essa hora passar,
Desiste de correr, pára, descansa!
Os seus olhos são tão bonitos com essa cor de tarde...
Não vá embora, segura minha mão,
Não me deixe sozinha nesse lugar tão cheio de gente
E tão vazio de almas!

- Não há o que se possa fazer,
Tenho que pegar esse trem,
Não há nada que eu possa fazer para permanecer aqui...
Seus olhos também são bonitos com essa cor,
Acho que nossos olhos combinam com
Essa luz tão linda, com essa luz furta-cor...

- Se essa luz é furta-cor,
Minha alma é como um prisma que capta
Toda essa magia que vem da luz dos seus olhos...
Olhos tão bonitos, tão sofridos, tão sentidos!
Não consigo ficar longe de você,
Não parta logo agora que tem a minha alma!

- Porque não vem comigo?
Oras, porque a surpresa?
O caminho é tão colorido! Outono amarronzado,
Inverno avermelhado, verão serpenteado...
E conosco seria sempre a primavera,
Com as nossas almas colorindo o céu de tanto anil...

- Não me pregue peças,
Não faça falsas promessas,
Se eu embarcar nesse trem agora,
Com suas mãos segurando as minhas,
Não te deixarei mais,
Seguirei seu corpo, seus olhos, sua alma
Para qualquer lugar que for. É sua sentença.

- Aceito.
Prefiro a enfadonha companhia do cotidiano a dois,
Que passar, conhecer, mergulhar em caminhos
Apenas comigo.
Sou boa companhia, mas contigo posso ser ainda melhor.
Venha logo, levanta!
O trem já vai partir...

- Irei!
Mas tenho que fazer a mala...

- Que mala?
Larga o teu passado, guarda as suas lembranças
Em um bom lugar no peito,
Aquece seu coração de coragem,
Segura em minhas mãos e vamos!
- Vamos!
Deixe que eu me sento ao seu lado,
Que eu segure suas mãos e que essa hora passe
Com a suavidade da paisagem da janela.
Temos a eternidade das horas
E a beleza de todos os segundos...

- Eu te amo.

- Também te amo.

Em qualquer lugar do paraíso,
Em qualquer lugar do purgatório,
Em qualquer lugar de repouso de nossas almas,
Estaremos ali, observando o encantamento
da eternidade, do perene, da história...

Claude Monet. Estação de São Lázaro, 1877, Paris.

domingo, 27 de maio de 2012

sentimentalidades tão mesquinhas


Não há mais nada para ser feito,
Ou simplesmente dito.
Não consigo entender as repetições dessa vida.
Há momentos tão tensos que a gente acaba perdendo o controle.
E acaba rasgando sentimentos tão bonitos.
Acaba amassado, estragado, inutilizado.
E foi assim comigo.
Tentei de todas as formas fazer o melhor das coisas,
Tentei provar pra todos que eu realmente estava
Ali disposta a amar e amar pra sempre.
Mas agora, nessa hora e nesse desencontro,
Penso que não fiz as coisas certas,
Entreguei novamente meus sentimentos
Ao vazio das esperanças.
Esperança que tinha em um dia
Ganhar um sentimento melhor,
Mas só ando me decepcionando,
Dia e noite, noite e dia, desde o dia que o conheci.
Mais lágrimas que sorrisos,
Mais sorrisos falsos que alegrias...
Enfim...
Realmente eu demoro muito a conseguir
Me livrar de sentimentalidades tão mesquinhas...


quinta-feira, 10 de maio de 2012

Não rifei um “eu te amo”...


Não rifei um “eu te amo”,
não disse assim, do nada.
Amor não é brincadeira,
e sim,
amor com amor se paga.
Agora eu não quero nada,
não quero ouvir suas palavras,
não quero ouvir o seu “te amo”,
quero apenas que não duvides
do tanto que transborda a minha alma
quando te vejo, te sinto, te ouço.
Não quero pensar em coisas vãs,
e nem conjecturar seus problemas de hoje
com um passado malvado.
Só quero pensar no seu rosto
iluminado pela luz do poste,
deitado de frente pra mim,
como uma fotografia em preto e branco.
Só quero sonhar com você em meus dias,
colorindo cada frestinha de harmonia,
me ensinando coisas que nunca vou aprender,
gargalhando com as coisas inúteis que digo.
Há vários amores em meu passado,
e há vários amores no seu,
mas o que torna esse meu amor tão especial
é apenas o sentindo que ele deu a minha vida.
Sua alma tem poder sobre a minha,
um poder de me acalmar, de dizer pra minha alma
que eu não preciso me fechar como tatu-bola.
Nossas almas já falaram sobre tudo,
tudo o que a gente ainda nem pensou em falar,
já foi dito, consumado, entrelaçado.
Eu não rifei um “eu te amo”.
eu realmente amo,
cada pedacinho do que te faz assim.
O seu silêncio, o seu sotaque, o seu olhar desconfiado
me encantam, sempre encantaram.
Não se apresse com nada,
não se pressione comigo.
Eu não tenho medo das palavras,
Não tenho medo dos sentimentos,
mas sei que você tem,
então eu te respeito.
Mas saiba que a ultima coisa que faria
seria quebrar seu coração.
Portanto, tente apenas não quebrar o meu...
Mas se quebrar,
não se preocupe!
Porque apesar das dores,
nunca vou desistir de amar.
Junto meus cacos e vou.
Mas quero que saiba que eu não rifei um “eu te amo”
simplesmente por rifar.
Saiba que eu te amo,
que contigo vou pra qualquer lugar,
que mesmo se eu não for,
você fica em mim
e eu te espero.
Mas só espero se for pra você voltar sempre pra mim.
Eu te amo,
não vou a lugar algum sem ter você comigo,
Seja em corpo,
 seja em alma,
 e eu só vou embora
se você mandar...

"A você eu amo, raramente me engano."
Caio Fernando Abreu.


quarta-feira, 25 de abril de 2012

Suspirando


Foi realmente muito lindo
quando te vi pela primeira vez
e pensei: te quero.
Foi.
Depois do lindo, o feio.
a luta, o choro, a dor...
Pior de tudo foi o sentimento de indiferença.
Foi.
Aí não quis abrir mão,
queria o óbvio,
prazer, sorrisos, cuidado.
Mas não tinha.
Mas era pouco.
A lindeza do primeiro olhar
aos poucos se perdeu nos terceiros
e quartos.
Mas insisti tanto que já não sei mais
se o que está escrito foi forçado
pela carência, pela ausência, pelo medo.
Não os meus capítulos,
todos tão lúcidos,
todos tão cumpridos...
Esperei bastante,
batalhei bastante,
ganhei algum prêmio?
Nenhum.
Agora me dá vontade de sentir
o que fiz sentir,
dá vontade de ser cortejada,
de ser querida e desejada.
Já não dá mais.
Sei bem lá no fundo
que comigo nunca vai existir
capítulos encantados,
romances bonitos,
olhar apaixonado...
Foi realmente muito lindo quando te vi pela primeira vez,
e depois de tantas curvas,
de tantas lágrimas,
ainda me sentar no mesmo jardim
e chorar as mesmas palavras,
e pegar a mesma indiferença,
e sonhar com palavras que nunca ouvi espontaneamente.
Só os bobos fazem isso.
só eu faço isso enquanto o mundo todo
esbalda-se em paixões, amores, delírios.
Sinto que não há amor para mim,
infelizmente sinto,
pois o que existe é a ausência
que me habita, tortura e entristece.
Mas realmente foi lindo aquele momento,
o momento que te vi pela primeira vez
e te quis,
como se fizesse um desejo ás nuvens e a chuva da tarde
eu te olhei sair,
e ainda espero voltar...

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