Breve histórico...

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"O diabo desta vida é que entre cem caminhos temos que escolher apenas um, e viver com a nostalgia dos outros noventa e nove." Fernando Sabino

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Das coisas que se tocam e que tocam por si mesmas.

Sou historiadora e tenho minha formação voltada para o campo da Historia da Arte. Já trabalhei com restauração de documentos e sei muito bem os problemas e os riscos de se tocar em objetos históricos, obras de arte, documentos...
Eu sei, não deveria dizer isso, mas eu tento tocar. Eu tenho uma necessidade imensa de sentir com meus dedinhos aquela coisa, tentar pegar com meus dedos as emoções que transpiraram da mão do artista ou da pessoa que escrevia determinado documento. Contudo, eu me mantenho firme racionalmente e sigo as regras de "não tocar", afinal, se todos nós tocássemos nas coisas, elas já teriam se deteriorado há muito.
Contudo, há lugares que posso exercer essa vontade, esse desejo, esse fetiche em paz. Em paz com meu eu racional e em paz com meu eu vândalo poético. Sempre, onde eu chego, quem chega primeiro é a mão. Ela corre pra tocar a pedra, o aço, a folha. Os olhos correm para cima, mas as mãos seguem o ritmo lento das superfícies irregulares, tentando absolver lembranças antigas, sentimentos antigos. Quantas pessoas já passaram por esses lugares, caminhos, casas, igrejas, castelos e tocaram o mesmo lugar que eu toco? Quando penso nisso, nesse momento do toque, eu me sinto conectada há milhões de sentimentos. Já detectei o medo, já detectei o gozo, já detectei a tristeza.
Ser historiadora aumentou a minha sensibilidade, que era um pouco afetada para picos de clichês sentimentais. Quem chora ao sentar numa varanda e tocar o parapeito e sentir o medo daquelas pessoas que ali estavam, quando avistaram o exercito inimigo? Quem ri ao tocar pedras pontiagudas e desajeitadas de muros construídos pelo suor dos escravos? Lugares que despertariam sentimentos inversos, quando tocados, trazem sua história, ou, o que imaginamos para elas. Da varanda e do muro, o medo e o amor se traduzem de forma desigual, as vezes equivocada. Porque sorrir ao passar a mão por cima de tanto sofrimento? Porque chorar ao tocar um lugar onde se tem a vista das mais belas paisagens? Não sei. São os sentimentos que me despertam quando eu tento chegar mais perto das coisas que nos tocam por si mesmas. O meu tato intruso tenta sentir mais daquilo que ninguém vê, daquilo que traduz sentimentos diversos.
Das coisas que se tocam, eu gosto dos muros, das paredes, das portas, das igrejas, dos túmulos, das escadas, das mesas... É uma conversa silenciosa entre a minha alma e as almas que ali passaram. É como se minha alma precisasse tocar aquilo para se acalmar. Meu coração disparou tanto quando toquei pela primeira vez um forro de igreja. Era como se naquele momento eu estivesse ali, conectada com o artista que realizou a obra. Era como se eu sentisse todos os sentimentos dele: o medo de cair, o medo de não fazer um bom trabalho, o prazer de pintar, as tintas nos dedos, os desejos de aumentar a fama de seu trabalho... cinco segundos de uma conversa inteira.
Das coisas que tocam por si mesmas, eu só posso dizer que tenho as obras de arte em grande conta! As pinturas, esculturas, papeis, música... Essas coisas não são para serem tocadas por nós, pois tocam mais fundo. Sem o tato, utilizo dos outros sentidos e não sou eu mais que as toco para senti-las, ao contrário, são elas que me tocam e conversam comigo. São elas que querem entender meus sentimentos, minha angustia, minha euforia, minhas sentimentalidades mesquinhas. E quando elas me tocam, tudo o que eu sinto, por instantes, fica estático e eu sorrio ou eu choro. Não se passa nada nesse hiato de tempo que dura milésimos de segundo. O choro cai ou a gargalhada salta inesperadamente para quem ta comigo: São as coisas que tocam por si mesmas enchendo minha alma de vida, e eu não controlo. Eu nunca controlei.

Acho que é por isso que gosto tanto de viajar e de conhecer lugares diferentes, para sentir, para dialogar, mesmo que tudo isso seja apenas minha imaginação histórica misturada com a poesia da vida...

Convento de Cristo
Não tô encochando o aqueduto não, viu gente!

Convento de Cristo

Batalha

Batalha

Leiria
Inhotim.
Guil me xingando, claro.

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