Queria escrever uma carta, escrever mesmo, tirar as cores das minhas canetas favoritas e rabiscar o papel branco com palavrinhas sentimentais. Idiotices sairiam, com certeza. Mas com certeza estaria gravado ali meus melhores sentimentos – ou talvez piores. Mas sentada aqui eu fico pensando se o meu amigo, a quem queria mandar a carta, gosta de receber cartas. Na verdade fico pensando em como entregaria uma carta assim para esse amigo. Inútil pensar.
Ando muito medrosa e estressada ultimamente. Ando mais ansiosa do que realmente deveria e jogo a culpa na minha incapacidade de ainda estar onde estou. Queria o mundo inteirinho pra mim, mas da forma como as coisas caminham é o mundo que logo vai querer se desfazer de mim, justamente por causa da minha inutilidade.
E com isso ainda na cabeça, ainda fico me perguntando se meu amigo ia gostar de receber noticias minhas via carta, e não via e-mail, sms ou mensagem inbox via Facebook e Orkut. Queria mesmo colorir o papel com minhas canetas favoritas... Sim, meu amigo pode se sentir privilegiado por ser um dos poucos a receber letra minha bordada com canetas colecionáveis...
Mas tenho medo. Na verdade ando muito medrosa e ansiosa. O medo vem de um lugarzinho estranho dentro do peito. Um medo de ficar sozinha no escuro e não conseguir pensar em nenhuma palavra boa, de não conseguir lembrar nenhum carinho que valesse a pena esperar. E a ansiedade me mata porque quero ir embora, mudar os caminhos, mas ao mesmo tempo estou presa nesse medo vazio. Por isso não sei escrever mais cartinhas. Misturaria mil coisas nas linhas coloridas que seria impossível me fazer compreender.
Toda vez que me pego pensando em escrever só me lembro de coisas que me desanimam completamente de pegar o papel, de escolher as canetas, de pensar em algo doce e sincero que transcreva meu sentimento real. Não sei também que sentimento real é esse. Por isso também tenho medo de escrever. Por isso também morro a cada instante. Não consigo mais seguir sem um plano. Sem um plano A, um plano B ou, ao menos, duas soluções que se encaixem bem na minha vida.
Ontem percebi que não sou mais quem eu era. Eu era uma pessoa mais doce, menos fria, mais romântica, menos pessimista. Olha o que essa vida tem feito de mim! Lentamente vou perdendo velhos sonhos e desejos... Vou deixando de lado planos e mais planos. Não consigo mais ver o mundo como via antigamente. Parece que alguma coisa bonita dentro de mim se rompeu e eu não consigo mais colar, remendar ou tampar. E isso não me deixa mais escrever como escrevia antigamente, no papel branco com canetas coloridas…
Na verdade acho que minhas canetas são um pedacinho de um mundo que eu perdi e que não vou mais ter, porque passou. Acho que nunca fui tão feliz como eu era quando comprava minhas canetinhas coloridas, com cheirinho de várias coisas que eu amava. Eu não tinha problemas, eu não tinha esse coração pesado, eu não tinha cobranças infindáveis. Só tinha a felicidade de um papel e as inúmeras canetas...
Meu pessimismo não me deixa escrever com as minhas canetas colecionáveis. Meu amigo até merece uma carta, mas não merece o conteúdo, não merece os sentimentos confusos que posso colocar ali. Acho que meu amigo não merece também essas preocupações. Acho mesmo que nem deveríamos ser amigos... Acho mesmo que deveríamos seguir sem contato, sem abraços, sem encontros, sem laços...
Acho que deixei esquecido em algum lugar minha melhor parte... e agora encontrá-la será difícil, quase impossível, porque esse meu amigo não é minha melhor parte. Porque se fosse, não estaríamos assim, tão distantes e sem cartas bonitas para trocar.
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Pierre Auguste Renoir-La carta-1895-1900 |
Mas confesso, minha amiga querida, que aquele amigo meu, que nada queres de mim, poderia sim, ser minha melhor parte, onde eu poderia buscar uma linha e uma agulha para coser novamente o fio do destino. Confesso que ainda tenho em mim um restinho de esperança. Pequena, mas forte o suficiente para me matar a cada novo dia, a cada nova noite... Confesso que ainda tenho sentimentalidades assim.
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